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A Política somos nós

A Política somos nós

19.04.22

Um exercício de raciocínio hipotético e utópico, onde imaginamos os habitantes de Ayamonte a invadir o sotavento algarvio, e que de armas apontadas nos sujeitem a um referendo onde teremos que escolher entre nós ou eles, - pode ilustrar o absurdo em si mesmo daquilo que se discute quando um povo vê as suas fronteiras violadas e a sua soberania posta em causa.

Perante um absurdo destes, estou curioso em saber qual seria a opinião e quais as reações por parte daqueles que defendem ou no mínimo tentam dissimuladamente legitimar as constantes invasões, agressões e crimes cometidos pela Federação Russa contra a Ucrânia.

Não sei se iriam legitimar a atitude do estado espanhol ou se pelo contrário iriam deixar crescer dentro de si mesmos um sentimento nacionalista e reagir face à agressão. Perante aquilo que tenho lido, estou convencido que iriam começar a passar férias no Gerês e esquecer isso do Algarve.

Assim como assim, a derrota perante o exército espanhol seria inevitável e como tal a melhor atitude seria a rendição. Quem sabe se não poderíamos ir todos até Vila Real de Santo António celebrar a bendita e desejada paz podre com os nossos novos proprietários. Aí celebraríamos um acordo onde nos comprometeríamos a abdicar da nossa capacidade de defesa territorial. Assim, quando Espanha quisesse avançar pelo Alentejo acima, teria a tarefa facilitada sem que um tiro seque fosse disparado.

Parece absurdo não parece? Pois foi exatamente isso que aconteceu na noite de 27 para 28 de Fevereiro de 2014, onde homens armados e soldados russos sem qualquer insígnia tomaram de assalto os edifícios do Parlamento e do Governo da Crimeia, parte integrante do território ucraniano. Por força de um ocupante estrangeiro, um país que estava em paz, passou a estar em guerra de um dia para o outro.

Depois deste assalto, o regime do Kremlin forçou a realização de um referendo no território da Crimeia para apurar qual a “vontade popular” em relação à soberania do mesmo. Ou se votava pela integração da Crimeia na Federação Russa ou se escolhia a manutenção da soberania ucraniana.

Perante as armas apontadas, os habitantes tiveram a óbvia “escolha” de abdicar da sua soberania, caso contrário teriam fortes possibilidades de ter que abdicar de muito mais do que isso. É esta a tipologia de eleições, referendos e sondagens de opinião que é praticada pela Federação Russa. A farsa e a “legitimidade” dos atos são asseguradas pela pressão das armas.

Estes são fatos históricos, provados e documentados, e só os desmente quem tem um raciocínio toldado por algum sabão bem esfregado, ou que sofreu de algum problema intestinal depois de ter comido um hambúrguer americano, e até hoje amaldiçoa a cultura ocidental.

Tanto a ocupação da Crimeia como a recente invasão são graves violações do direito internacional e constituem sérios crimes contra a soberania de um estado soberano e independente. Ponto final.

Para os defensores do indefensável, o único caminho para a paz é a diplomacia com os dirigentes do Kremlin, leia-se, com Putin, - o que neste caso concreto significa preto no branco, - a Ucrânia abdicar das regiões ocupadas, abdicar da sua defesa nacional e com um jeitinho mais, permitir a instalação em Kiev um governo às ordens do Kremlin.

É esta a solução moral que defendem aqueles que confortavelmente debitam asneiras deste lado do mundo, onde a democracia admite até os não democratas e onde nas ruas se circula em liberdade sem o fantasma da ocupação, da agressão e do assassinato. Onde a soberania, o direito à autodeterminação e à honra, não se entregam de mão beijada. Onde a paz só faz sentido quando é vivida com dignidade.

A estes defensores da paz dos submissos e dos desonrados, não sei o que lhes sobra mais, - se a dita ensaboadela encefálica ou a simples covardia.

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